A importância das relíquias vem desde o Concílio de Trento (1563), seguindo a tradição da Igreja Antiga e Medieval e depois dos séculos XVI e XVII, foi atribuída às relíquias em resposta à rejeição fomentada por Calvino em 1543. Trento, em sua XXV sessão, exortou os bispos a que os fiéis fossem instruídos sobre a importância da intercessão dos santos, a veneração das relíquias e o uso legítimo das imagens. Como campeão da Contrarreforma, Santo Inácio de Loyola apreciava muito a posse de relíquias em seu tempo, embora o mau uso dessa devoção, tão frequente no povo, causasse não poucos excessos em sua multiplicação e falsificação.
Das autênticas relíquias de São Francisco Xavier, destacam-se duas: o corpo incorrupto do santo, venerado na basílica do Bom Jesus, em Goa, após a sua morte, foi transferido de Malaca e do seminário de São Paulo, e que continua a convocar milhares de peregrinos, mesmo não cristãos, quando exposto aos fiéis de dez em dez anos. A segunda relíquia importante é o braço direito de Xavier, aquele que "se cansou" de tanto batizar, e que está preservado na igreja do Gesù, em Roma, braço que fez uma peregrinação a várias partes do mundo para comemorar diferentes aniversários. Outros são de menor importância, como tecidos, objetos tocados pelo santo, um livro, um sapato... Destes, o mais célebre é o famoso "Crucifixo do Caranguejo", que está preservado no Palácio Real de Madrid.
Há uma terceira relíquia pessoal, cuja origem um tanto macabra. Durante a primeira exposição do corpo incorrupto de Francisco Xavier em Goa, em Sancian, transferido de Malaca, o povo desfilou incessantemente diante do corpo. Era vigiado por dois jovens jesuítas, que irresponsavelmente dormiram atingidos pelo sono. O que foi aproveitado por uma senhora, dona Isabel de Cron, presa de devoção tola, deu uma mordida ao dedo mínimo da mão esquerda, sem que o paradeiro da relíquia fosse conhecido. O dedo seria mais tarde devolvido ao santuário de Bom Jesus, em Goa, exceto por um fragmento dele, que foi inicialmente embutido em um relicário na forma de um relógio de bolso de senhora.
Cinco séculos depois, em 2006, uma carta de um descendente da família Mendia de Castro (Nova Goa), a quem tinham entregado em 1680, em nome de dom Rodrigo da Costa, governador da Índia, o baú com a relíquia. Foi dito que era vontade doar a relíquia, documentada e preservada de pai para filho, à Companhia de Jesus. Assim, o relicário preservado por hereditariedade através das famílias dos Costas (1686-1708), dos Almeidas (1708-1779) e dos Castro (1779-2009), chegou a ser doado à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa por dona Teresa Mendia de Castro (Nova Goa) em 2009.
São Francisco Xavier assume um papel de integrador e unificador da comunidade católica de Goa, tanto residente como da diáspora. Também entre os praticantes das religiões mais representativas da cidade, como hindus e muçulmanos, seu culto é reconhecido. Descrito como Goencho Sai – o Senhor de Goa – seus milagres e a incorruptibilidade de seu corpo contribuíram. A vida, o trabalho exemplar de Xavier na Companhia de Jesus e sua tarefa evangelizadora, como inspiração e ajuda para os goeses e portugueses, permanecem na memória coletiva [...].
Pierre Michael Lamet