Uma das coisas interessantes que sempre encontrei nos livros do teólogo Leonardo Boff é que ele cita frases valiosas e significativas de vários autores. No livro “Virtudes para um outro mundo possível Volume 2 Convivência respeito e tolerância” Editora Vozes 2006, aquele teólogo cita alguns textos de Albert Schweitzer que suscitaram dentro de mim algumas luzes e considerações sobre a ética, sobre o respeito diante da vida assim como sobre o princípio da legítima defesa: ”eu sou vida que quer viver no meio de vidas que querem viver.
Somos interligados, conectados, somos irmãos e irmãs compartilhando uma história em que o mundo poderia ser a nossa casa comum e a humanidade poderia ser a família de todos. A minha vida se torna, também, uma existência mais saudável e mais fecunda na medida em que eu sentir, praticar e comunicar a responsabilidade e o cuidado para com a vida das pessoas ao meu redor e das pessoas no mundo inteiro. ”A ideia chave do bem comum consiste em conservar a vida, desenvolve-la e eleva-la ao seu máximo valor; o mal consiste em destruir a vida, prejudica-la e impedi-la de se desenvolver”.
Este é o princípio necessário, universal e absoluto da ética. Somos chamados a escolher: a vida é uma escolha diária e permanente entre o bem e o mal e o não bem, entre a justiça e as injustiças e a não justiça, entre a compaixão e a indiferença e a não compaixão, entre a reconciliação e a vingança e a não reconciliação.
Dizia o meu mestre de noviciado: “podemos escolher o que semeamos; só que depois somos obrigados a colher aquilo que plantamos”. Sabemos por experiencia que para cada ação existe uma reação, porque todas as ações (inclusive as não ações – omissões) trazem consequências e efeitos colaterais. “Tu deves viver convivendo e conservando a vida: este é o amor dos mandamentos da sua forma mais elementar”.
Além das crenças religiosas em que acreditamos ou das visões políticas partidárias que temos, ou das profissões que exercemos, o mandamento de respeitar, de defender, de proteger e de conservar a vida, tanto a nossa como a alheia, é algo de básico e de fundamental em todos os continentes, em todas as culturas e em todas as situações.
“Mantenha teus olhos abertos para não perder a ocasião de ser um salvador”.
O verme que se perdeu na estrada dura e seca e que não pode fazer o seu buraco, retire – o e coloque – o no meio da grama. Abraçando a história da nossa vida percebemos que somos muito mais do que comparsas e espectadores porque, com nossa consciência, com os nossos comportamentos e com as nossas atitudes podemos sentir a beleza de sermos protagonistas, sujeitos e operários na construção de um mundo, de um aís, de uma cidade, de um bairro, de uma rua, de uma casa em que cresça e se espalhe a cultura da vida, do cuidado, da solidariedade e da partilha.
O princípio da legítima defesa
O amor a si mesmo é um princípio fundamental da ética do respeito. Viver é em primeiro lugar respeitar – se. Por isso, o princípio ético da legítima defesa se torna um grave dever no coração e nas mãos de quem protege a própria vida e é responsável pela vida de outrem. «Do ato de defesa pode seguir-se um duplo efeito: um, a conservação da própria vida; outro, a morte do agressor» escreveu Santo Tomás de Aquino. A intenção de quem quer se defender, e não se vingar, é sempre algo de relevante nas avaliações dos comportamentos cometidos, assim como em situações de violência. Insiste Santo Tomás de Aquino: «nada impede que um ato possa ter dois efeitos, dos quais só um esteja na intenção, estando o outro para além da intenção».
E depois é claro que o princípio da legitima defesa vai junto com o outro princípio, o da proporcionalidade. «Se, para nos defendermos, usarmos duma violência maior do que a necessária, isso será ilícito. Mas se repelirmos a violência com moderação, isso será lícito [...]. E não é necessário à salvação que se deixe de praticar tal ato de defesa moderada para evitar a morte do outro: porque se está mais obrigado a velar pela própria vida do que pela alheia» garante o mesmo Santo Tomás de Aquino.
A remissão da vida
Defender o bem e promover o bem comum implica, também, colocar a pessoa que agride na impossibilidade de fazer mal. O esforço de uma Nação e de um Estado em reprimir a difusão de comportamentos que lesam os direitos humanos e as regras fundamentais da convivência civil, corresponde a uma exigência de preservar o bem comum. A ética do respeito nos ensina a respeitar também quem nos agride e nos ensina que o ser humano - pela força do livre arbítrio e de processos de reabilitação - pode viver caminhos de recuperação, de conversão, de transformação e de vida nova.
Ninguém nasce ‘criminoso’ e todo ser humano, com consciência e com o próprio poder da vontade de viver mais para ser melhor - pode se redimir e recomeçar uma vida nova, mais digna, mais humana e, com absoluta certeza, mais feliz.
Pe. Gabriel Guarnieri sx